Decreto do
governo inclui a loteria esportiva no Programa Nacional de Desestatização
(PND). Isto significa o jogo será gerido por empresários e não terá mais
recursos destinados a programas sociais
Em mais uma investida contra os programas públicos
sociais e as estatais, Jair Bolsonaro (ex-PSL) assinou nesta quarta-feira (19)
um decreto que abre caminho para o controle da loteria esportiva, hoje um
serviço público exclusivo da União, para as mãos da iniciativa privada.
A lógica de Bolsonaro e seu ministro da Economia, o
banqueiro Paulo Guedes, é perversa. Ao incluir a loteria denominada de “Apostas
de Quota Fixa”, mais conhecida como loteria esportiva, no Programa Nacional de
Desestatização (PND), o governo libera a iniciativa privada para gerir esse jogo
de apostas de modalidades esportivas, que pode ser de jogos de futebol, vôlei,
basquete etc, com uma premiação maior do que a oferecida pela Caixa Econômica
Federal (CEF).
“Se um jogo oferece uma premiação maior, lógico que
vai atrair mais apostadores e ao longo do tempo vai minguar a fonte de
arrecadação das loterias Caixa, afetando apostas da Megassena, Lotofácil, quina
e outras. O mais provável é que a CEF tenha uma queda de participação de
mercado entre 80% e 90%. As Loterias Caixa morrerão por inanição”, denuncia o
diretor da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica
Federal (Fenae) Jair Pedro Ferreira.
O maior problema, segundo o dirigente, é que
enquanto um ou mais “sortudos” vão ganhar mais, o restante da população
brasileira, que depende de projetos sociais, perderá e muito. Hoje, o apostador
de loterias Caixa fica com 43% do valor arrecadado e o restante vai para
programas sociais. O novo jogo da iniciativa privada prevê que o apostador
fique com de 79% a 80% do total arrecadado.
MODALIDADE |
% do faturamento da loteria
destinado a pagamento de prêmios (payout) |
% do faturamento da loteria
destinado a programas sociais |
Loterias CAIXA* |
43,0 |
37,1 |
LOTEX |
65,0 |
16,7 |
Loteria Quota Fixa (meio físico) |
80,0 |
6,0 |
Loteria Quota Fixa (meio virtual) |
89,0 |
3,0 |
Com isso, os brasileiros vão perder 37% de recursos destinados à educação,
saneamento, cultura, seguridade social, entre outras áreas. É a chamada verba
carimbada, que as loterias da Caixa são obrigadas a enviar a programas sociais.
Já a previsão de repasses da loteria privada é de 3% a 6%. Uma diferença a
menor de mais de 30%.
Descontados os prêmios, os impostos e o custo
operacional e de distribuição das loterias, a Caixa apropria cerca de 3% do
faturamento em seu resultado líquido, o que representou aproximadamente R$ 0,5
bilhão em 2019.
O volume de dinheiro que será perdido é imenso.
Segundo a Fenae, no ano passado foram arrecadados R$ 16,7 bilhões, dos
quais R$ 6,2 bilhões foram transferidos para os programas sociais do governo
federal. Somente a mega da Virada de 2019 registrou sua maior arrecadação na
história, mais de R$ 1 bilhão, exatos: R$ 1.028.882.101,50. Numa conta simples,
o país perderia em apenas um jogo da mega da virada R$ 370 milhões.
O diretor da Fenae estima que haja um mercado ainda
maior de jogos que chegue a R$ 20 bilhões ao ano, sendo R$ 16 bi legais das
loterias Caixa e mais R$ 4 bi de jogos clandestinos como jogo do bicho, apostas
em cavalos e cassinos.
“O valor estimado de R$ 20 bilhões ao ano não vai
mudar, mas é muito dinheiro que vai para as mãos da iniciativa privada com uma
contrapartida social baixíssima. Bolsonaro também liberou premiação em dinheiro
pela TV. Uma emissora pode oferecer R$ 3 mil de prêmio e arrecadar R$ 300 mil,
em apenas uma tarde nesses programas de premiação que estavam proibidos”,
acredita Ferreira.
O decreto de Bolsonaro
O decreto nº 10.467, de 18 de agosto de 2020,
publicado no Diário Oficial desta quarta-feira (19), basicamente inclui o
serviço público de loteria denominado “Apostas de Quota Fixa” no Programa
Nacional de Desestatização – PND, e determina que o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) liderará o processo de
desestatização dessa nova modalidade de loteria, que foi criada na Lei 13.756, de 12 de dezembro de
2018.
A lei de 2018 instituiu no país a modalidade
lotérica em que o apostador tenta prever o resultado de eventos reais
esportivos e determinou que as apostas sejam realizadas em ambiente
concorrencial, com a possibilidade de delegação do serviço à iniciativa
privada.
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